DIA #8

DIA #8

Tanta gente [ou Falta comida, e tanta no lixo]

Dakhla (Saara Ocidental) – Birgandouz (Saara Ocidental) [300 km]

O dia começou com uma mãe e o seu filho a pedirem-nos comida. Há coisas que não tenho capacidade para imaginar. Pedir, seria certamente algo muito difícil mas, pedir comida para um filho, com ele ao lado, sinceramente, não consigo imaginar. Não ter com que alimentar os nossos filhos será certamente uma das maiores dores do mundo. Principalmente num mundo em que tanta comida vai parar ao lixo.

O Índice de Desperdício de Alimentos 2021 indica que cerca de 17% da produção total de alimentos foram para o lixo em 2021. O nosso planeta caminha rapidamente para os 8 mil milhões de habitantes. Se não invertermos a tendência, acredito que, brevemente, haverá ainda mais fome e, mesmo assim, ainda mais comida desperdiçada.

Estima-se que até hoje viveram cerca de 108 mil milhões de pessoas. Isso quer dizer que cerca de 7% de toda a população humana de sempre está viva neste momento. Estes números tornam óbvia a pressão sobre o nosso planeta, mas continuamos num ritmo de consumo completamente bipolar e irracional.

Voltando ao percurso do dia, o nosso seguro automóvel terminará às 2h55min de amanhã de madrugada, mas só conseguiremos passar a fronteira para a Mauritânia ao início da manhã. Por isso, tentamos encontrar uma forma de prolongar o seguro. Bastava-nos estendê-lo por mais 6h. Depois de várias tentativas de contactar a seguradora por telefone e email, sem respostas, decidimos procurar na Internet uma agência representante da seguradora. Depois de identificar a localização da agência mais próxima, não foi possível encontrá-la. Com a esperança de nos poderem orientar, entramos noutra seguradora: a Axa Internacional. Foi lá que conhecemos o Sidi que, quando percebeu que eramos de Portugal, recebeu-nos com um “F@d@-se, C@r@lh@”. Depois de uma curta conversa, Sidi encaminhou-nos para a seguradora que nos poderia resolver o problema. Infelizmente, não foi assim tão fácil. Andamos de seguradora em seguradora que felizmente não eram longe uma das outras:

AXA – Matu – Sanlan – Sanad – Matu

Tendo a resolução do problema entrado num ciclo infinito e tendo em conta que ninguém nos ia prolongar o seguro por mais um dia, foi necessário fazer um novo seguro. Voltamos à AXA internacional onde pude voltar a falar em “Português” com o Sidi que me deu boleia no seu fantástico carro até mais uma seguradora. Tentei trocar o seu carro pela Blatt, mas ele não aceitou. Sidi é formado em “International Law” e até me mostrou o diploma, que trazia no carro. Em Marrocos, só há 3 pessoas formadas nessa área. Pelo meio da conversa disse que já tinha visto a Blatt em Agadir. O mundo é mesmo pequeno. 

Finalmente, depois de 2h de seguradora em seguradora, resolvemos o problema. Ou pelo menos, parecia. Isto porque ao sair em direcção a Birgandouz, vimos que o seguro que tínhamos era a partir de Sábado às 0h. Ou seja, continuávamos sem seguro nas horas desejadas. Tivemos de voltar para trás e depois de muita luta finalmente tivemos o seguro com a data e horas certas.

A viagem até Birgandouz foi tranquila. Acho que nunca me esquecerei das imagens de uma cáfila a atravessar a estrada, mesmo à nossa frente. Foi tão lindo. Lembrei-me que uma das ementas de ontem à noite era camelo. Preferia não me ter lembrado.

Passamos a noite no famoso Barbas, onde há cerca de 3 anos também já tinha passado a noite.

Amanhã de manhã seguimos para a Mauritânia. A dura Mauritânia 🇲🇷


Música do dia: Johanne Brahms Intermezzo in B Flat Minor Op 117 N.º 2 (por Khatia Buniatishvili)