DIA #5

DIA #5

Uma empatia de acção [ou Darwin, Darwin, Darwin]

Marrakech (Marrocos) – Tan-Tan Plage (Marrocos)

hu·ma·no
(latim humanus, -a, -um)
adjectivo
[…]
2. Que mostra sentimentos de compaixão, benevolência ou solidariedade. = BENÉVOLO, BENFAZEJO, BONDOSO, COMPASSIVO, COMPREENSIVO ≠ DESUMANO, INUMANO, INCOMPREENSIVO, IMPIEDOSO

Este foi um dia já com bastante deserto. Para esta viagem fomos tentando preparar-nos para tudo o que poderia acontecer, mas há sempre algo a nos surpreender. Hoje foram as chuvas torrenciais. Quando a estrada é boa, até sabe bem, mas quando a estrada está esburacada, não dá para perceber a profundidade destes.
Outra coisa que, no meio do deserto vai-se encontrando e que no início causa alguma surpresa são placas que dizem “Atention! Passage D’animaux Domestiques”. Nestas placas, os animais domésticos referidos são os dromedários. Os dromedários não são bem animais domésticos porque não cabem dentro de casa. Talvez por isso, acabam por sair para o deserto. Também no meio do deserto, junto às bombas de gasolina que vão aparecendo, está sempre um cão que mendiga restos de comida. Nas cidades, vamos encontrando gatos que entre o medo e a esperança de receber alguma coisa, vão-se aproximando de nós. Os burros vão transportam grandes cargas, chicoteados para acelerarem.
A humanidade representa uma muito pequena parte da biomassa, mas explora e perturba uma quantidade enorme de animais de forma inumana. Cerca de 95% da biomassa mamífera são os humanos e os animais que “cultivamos”. Todos os animais selvagens que gostamos de ver nos programas de domingo de manhã representam apenas 5% da biomassa terrestre mamífera. Uma lição de moral é que os vírus e as bactérias, todos juntos pesam incrivelmente mais do que nós. Dá-nos a ideia que é necessário avançarmos com uma dieta reforçada de humanidade.
Por aqui, o problema de bem-estar animal, eventualmente relativizada pelas dificuldades que muitas pessoas passam, encontra-se na rua. Em grande parte do mundo, a falta de humanidade encontra-se em locais bem definidos e onde o sofrimento é feito a uma escala monstruosa. A industrialização da utilização da vida animal tem de ser repensada.
Um dos meus grandes heróis é Charles Darwin. Darwin, como sabem, estabeleceu a ideia que todos os seres vivos descendem de um antepassado comum. É um dos meus heróis não só pela sua teoria, mas pelo facto de ter desenvolvido a sua teoria contra tudo o que lhe ensinaram e contra tudo o que ele acreditava. Caminhar contra o que se acredita, especialmente quando todos acreditam no mesmo, é o equivalente a partilharmos as fundações da nossa casa, substituindo os espaços vazios por areia e mesmo assim ter a esperança que vai estabilizar e que a porta da entrada ainda esteja acessível.
Um motivo especial para gostar da teoria é que esta coloca os homens e as mulheres mais próximos dos restantes animais. Isso dá-me esperança. Num dos grandes debates sobre a teoria da evolução, Darwin não se sentido capaz de a defender, foi representando por Thomas Huxley que foi questionado se, no caso dele, o macaco provinha do lado da avó ou do avô. Huxley respondeu que preferia ter um familiar macaco a estar ligado a um homem que utilizava os seus talentos para esconder a verdade. Erik Satie dizia que quanto mais conhecia os homens, mais admirava os cães. Sinto tudo isso quando vejo o telejornal.
Darwinisticamente estamos programados para sermos melhores para aqueles que carregam os nossos genes. Se é difícil olhar para a humanidade como uma grande família, compreendo que olhar para aqueles que geneticamente estão mais afastados é ainda mais complicado.

em·pa·ti·a
(grego empátheia, -as, paixão)
nome feminino
Forma de identificação intelectual ou afectiva de um sujeito com uma pessoa, [animal], uma ideia ou uma coisa.

Uma coisa que me incomoda é quando se pergunta a uma criança se gosta mais do pai ou da mãe. Este tipo de ordenação torna-nos gestores de emoções, tornando a nossa empatia um recurso escasso. Estou certo de que é possível fazer o melhor para aqueles que nos estão próximos, sem esquecer os que estão um pouco mais longe, e até aqueles que geneticamente estão mais afastados.
No entanto, precisamos de uma empatia que não seja apenas de experienciar sentimentos de afeto e preocupação. É necessária uma empatia que nos coloca no lugar do outro. É necessária uma empatia que não seja apenas para olhar, seja para dentro de nós ou para ou outro. É necessária uma empatia de acção.
[70%]


Música do dia: Erik Satie – Gnossienne N.º 4

Vídeos
Save Ralph: https://www.youtube.com/watch?v=G393z8s8nFY
There’s a Rang Tan in my bedroom: https://www.youtube.com/watch?v=zyOAKLC7fPc

Fontes :
https://dicionario.priberam.org/humana
https://dicionario.priberam.org/empatia
https://www.pnas.org/doi/full/10.1073/pnas.1711842115